O texto abaixo é parte do
artigo ANÁLISE CRÍTICA DO DISCURSO
UMA PROPOSTA PARA A ANÁLISE CRÍTICA DA LINGUAGEM elaborado
por Cleide Emília Faye Pedrosa (UFS) disponível integralmente na internet no
endereço http://www.filologia.org.br/ixcnlf/3/04.htm. Como o meu propósito é trazer alguns conceitos básicos, segue abaixo, o fragmento que trata da questão.
"Conceitos básicos
Discurso
Esse
termo corresponde mais ou menos às dimensões textuais que, tradicionalmente,
têm sido tratadas por “conteúdos”, “significados ideacionais”, “tópico”,
“assunto” etc.
Há uma boa razão para usar “discurso” em vez desses termos
tradicionais: um discurso é um modo particular de construir um assunto, e o
conceito difere de seus predecessores por enfatizar que esses conteúdos ou
assuntos – áreas de conhecimento – somente entram nos textos na forma mediada
de construções particulares dos mesmos (FAIRCLOUGH, 2001: 64, destaque do
autor).
A
relação entre discurso e estrutura social tem natureza dialética, resultando do
contraponto entre a determinação do discurso e sua construção social. No
primeiro caso, o discurso é reflexo de uma realidade mais profunda, no segundo,
ele é representado, de forma idealizada, como fonte social. A constituição
discursiva de uma sociedade decorre de uma prática social que está,
seguramente, arraigada em estruturas sociais concretas (materiais), e,
necessariamente, é orientada para elas, não de um jogo livre de idéias na mente
dos indivíduos.
Fairclough
(2001) defende o discurso como prática política e ideológica. Como prática
política, o discurso estabelece, mantém e transforma as relações de poder e as
entidades coletivas em que existem tais relações. Como prática ideológica, o
discurso constitui, naturaliza, mantém e também transforma os significados de
mundo nas mais diversas posições das relações de poder.
Contexto
Trata-se
de uma noção de relevância ímpar para ACD, “já que explicitamente inclui
elementos sociopsicológicos, políticos e ideológicos e, portanto, postula um
procedimento interdisciplinar” (MEYER, 2003: 37). Os discursos são históricos
e, destarte, só podem ser entendidos se em referência a seus contextos
(FAIRCLOUGH, 2003).
Sujeito
Para
Fairclough (2001), os sujeitos podem contrapor e, de forma progressiva,
reestruturar a dominação e as formações mediante a prática, isto é, os sujeitos
sociais são moldados pelas práticas discursivas, mas também são capazes de
remodelar e reestruturar essas práticas. Na ACD, rejeita-se firmemente o
‘sujeito assujeitado’ da Análise do Discurso (AD).
Identidade
A
identidade tem a ver com a origem social, gênero, classe, atitudes, crenças de
um falante, e é expressa a partir das formas lingüísticas e dos significados
que esse falante seleciona, passando-se à maneira como o produtor de um texto
(editor) retextualiza a fala de um locutor, atribuindo-se uma identidade e
outra para esse locutor.
Intertextualidade e interdiscursividade
As
categorias intertextualidade e a interdiscursividade são bastante exploradas
pela ACD, pois ela analisa as relações de um texto ou um discurso, considerando
outros que lhe são recorrentes. É apropriado lembrar, aqui, o posicionamento de
Bakhtin (2000) de os textos “respondem” a textos anteriores e, também, antecipam
textos posteriores.
Crítica, ideologia e poder
As
noções de crítica, ideologia e poder são básicas para a ACD. Entende-se a
crítica, segundo Wodak, como o resultado de certa distância dos dados,
considerados na perspectiva social e mediante uma atitude política e centrada
na autocrítica. Já ideologia é um termo utilizado para indicar o
estabelecimento e conservação de relações desiguais de poder. Ele “se refere às
formas e aos processos sociais em cujo seio, e por cujo meio, circulam as
formas simbólicas no mundo social” (WODAK, 2003: 30, tradução nossa). Por isso,
a ACD indica, como um de seus objetivos, a desmitificação dos discursos por
meio da decifração da ideologia.
A
linguagem classifica o poder e expressa poder. Esse poder se manifesta segundo
os usos que as pessoas fazem da linguagem e suas competências para tanto. Ele
pode ser, em alguns casos, negociado ou mesmo disputado, pois é rara a ocasião
em que um texto é obra de uma pessoa só. Ressalta Wodak:
Nos textos, as diferenças discursivas se negociam. Estão regidas
por diferenças de poder que se encontram, por sua vez, parcialmente codificadas
no discurso e determinadas por ele e pela variedade discursiva. Como
conseqüência, os textos são com freqüência arenas de combate que mostram as
pistas dos discursos e das ideologias encontradas que contenderam e batalharam
pelo predomínio (WODAK, 2003: 31, tradução nossa).
É
bom entendermos que o poder não se origina da linguagem. Entretanto, é
possível, na linguagem, valer-se do próprio poder para desafiá-lo ou, mesmo,
subvertê-lo, alterando-lhe as distribuições em curto ou longo prazo. O poder
não somente se efetiva no interior do texto, através das formas gramaticais,
mas, também, no controle que uma pessoa é capaz de exercer sobre uma situação
social, através do texto (WODAK, 2003)."